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Sobre a origem do inferno e o que ele é.

  
Rodrigo Lavor (cand.)


Deus não tem princípio e nem fim; é um ser espiritual que não precisa de ninguém para existir.
Deus, no uso da sua Liberdade, decidiu criar os anjos mediante um ato de suma bondade: eles foram chamados à vida para participar da felicidade de Deus e sua felicidade depende de que O adorassem e O servissem. 
Muitos pensam que a Onipotência divina reside no fato de Ele poder fazer tudo. Mas, isto não é assim. Deus (o Existente e Criador) não pode deixar de existir nem de ser o Centro da Realidade dado que tudo depende d'Ele; Deus não pode criar um círculo quadrado, já que um círculo é um círculo e um quadrado é um quadrado. 
Logo, adorar e servir a Deus não é fruto do capricho divino, senão uma condição inerente da criatura em relação ao Centro da Realidade. Ir em contra do centro, é odiar e não servir, afastando-se do centro. 
Como o bem é difusivo, dizem autores espirituais que Deus quis contar aos anjos seu Projeto de Amor o qual contemplava a criação do ser humano (espírito e corpo) e o ato de Deus fazer-se homem. O Projeto de Deus não parava nos anjos; haveriam outros seres mais frágeis com os quais Deus também queria partilhar sua felicidade: os homens. Mais ainda, Deus se faria um deles, se faria fraco. 
Ora, servir a um Espírito puro (Deus) como eles é uma coisa; ter que servir a Deus feito homem (de matéria e frágil) gerou um momento decisivo para os anjos.
Aceitar implicava pôr-se ao serviço da concretização do Projeto divino; negar implicava opôr-se e lutar para que não se realize. 
Chegamos aqui a uma realidade crucial da criação: a liberdade! 
Quis Deus na sua Liberdade, dar uma liberdade real ao seus anjos, uma liberdade capaz ate mesmo de uma opção ilógica: optar contra o Centro da realidade e afastar-se d'Ele. 
No caso dos anjos, eles viram o Projeto de Deus, viram a Deus a cara a cara: todas as cartas foram postas sobre a mesa. Não houve jogo escondido. A decisão, nestas condições, seria definitiva e livre.
Um arrependimento sempre é um ato de amor, ato de abertura, reconhecimento da dependência, retorno à comunhão. Um homem pode ou não fazer tudo isto; um demônio, não.
Um demônio é um ser sombrio cujo orgulho corroeu; o orgulho é a negação do amor; é ato de fechamento; proclamação de auto-suficiência, permanência no isolamento. Um demônio não pode amar; logo não pode abrir-se, não pode reconhecer sua dependência e voltar a comunhão com Deus. 
Para nós, esta ideia de opção definitiva resulta repulsiva uma vez que não vemos as coisas claras, não conhecemos bem o Projeto de Deus no desenvolvimento da quotidianidade e, assim, quando erramos porque somos fracos, temos chances ao longo da vida de recomeçar. 
O anjo que caiu primeiro foi o mais poderoso do Céu: Lúcifer. Teria dito: "Non serviant" (não servirei). Ao cair ele, conseguiu enganar e levar consigo muitos outros que também não quiseram servir o Projeto de Deus. Lúcifer optou contra Deus; quis ser deus sem Deus e, os outros, além de ir em contra de Deus, se puseram ao serviço de Lúcifer (para permanecer servindo a um ser que é de espírito puro, ainda que seja uma criatura).
Para quem acha que Deus criou o inferno se engana. O inferno foi feito pelo Diabo e os seus anjos (demônios) para poderem estar longe de Deus para sempre. O inferno é um estado existencial no qual há total afastamento de Deus. No inferno, só há ódio, divisão, blasfêmia, sofrimento, amargura, escuridão, solidão. 
O inferno existe com o PESAR de Deus. Deus é "forçado" a aceitar o inferno e a oposição ao Seu Plano Amoroso em virtude da liberdade inviolável que outorgou às suas criaturas. O inferno é um lugar sem esperanças porque não se pode derrotar a Deus. 
A única esperança que resta ao Diabo e seus anjos é poder destruir a felicidade de quem ainda pode optar por Deus: os homens.
Muita gente pensa que a existência do inferno prova que Deus não é bom. 
Isto é um pensamento ingênuo que parte de quem ainda pode amar: nós. "Sentimos" um certo tipo de compaixão pelos demônios, dado que eles vão sofrer para sempre, contudo, sendo objetivos, não podemos ser compassivos para com aqueles que optaram contra Deus, que O odeiam e nos odeiam. Há uma guerra espiritual e eles querem nos destruir. 
O inferno existe, justamente em virtude da bondade de Deus. 
Se houvesse algo que pudéssemos tirar do Evangelho, talvez este algo fosse o inferno.

Em síntese: O inferno é aquele lugar no qual a pessoa diz para Deus deixá-la em paz porque sua presença bondosa e amorosa o atormenta. E é isto o que Deus faz: a deixa "em paz" para sempre.

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