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Tempo oportuno

Não faz mal a ninguém orar, amar o próximo e educar a própria vontade!
Dom Alberto Taveira Corrêa



Ganhar tempo, aproveitar o tempo, antecipar-se, não perder tempo... São expressões encontradiças em nossa boca com extrema frequência. Diferente do adulto é o tempo da criança, ou os sonhos do adolescente com a vida, ou o tempo carregado de memórias dos anciãos. Tempo medido e contado ou tempo a ser desfrutado ou, quem sabe, desperdiçado. Tempo simbólico, quarenta anos ou quarenta dias, vinte e cinco ou cinquenta anos, aniversários e jubileus! Fomos feitos por Deus e mergulhados no tempo, não apenas aquele que a física estuda ou é marcado pelo relógio, mas o tempo presente, dado por Ele, carregado de sentido porque se torna história de nossa salvação.

A sabedoria milenar na Igreja construiu, pouco a pouco, o que se chama “Ano litúrgico”, com o qual, a partir da Morte e Ressurreição, seu “Mistério Pascal”, os cristãos percorrem os eventos da vida do Senhor nesta terra, para o reconhecerem sempre presente (Mt 28,20), até sua vinda gloriosa no final dos tempos. A pedagogia da Igreja nos faz reencontrar os mesmos acontecimentos salvíficos, mas nos espera crescidos e mais maduros, capazes de acolher melhor as graças de cada época do ano. Todas as suas etapas são “tempo oportuno”. Atualiza-se o apelo do Apóstolo São Paulo: “Como colaboradores de Cristo, nós vos exortamos a não receberdes em vão a graça de Deus, pois ele diz: ‘No momento favorável, eu te ouvi, no dia da salvação, eu te socorri’. É agora o momento favorável, é agora o dia da salvação” (2 Cor 6,1-2).

Quarenta dias dedicados à oração, à fraternidade e ao jejum! Todas as pessoas que fazem uma experiência “religiosa”, mesmo em outras vertentes, até não cristãs, descobrem a necessidade de um relacionamento com Deus, um novo trato com o próximo e as exigências de um equilíbrio das forças de sua própria natureza. Observe-se que muitas delas fazem dietas ou jejuns muito mais estritos e exigentes do que a Igreja propõe para a Quaresma, por motivos espirituais, estéticos ou por prescrições médicas. É que não faz mal a ninguém orar, amar o próximo e educar a própria vontade!

Entretanto, a Igreja celebra a Quaresma com um olhar mais amplo e profundo. Como os cristãos assim se chamam por ter recebido no Batismo a vida nova nascida do próprio Cristo morto e ressuscitado, celebram cada semana, no domingo, a sua Páscoa, e a comemoram anualmente, preparados pela Quaresma, renovando, como num aniversário de Batismo, sua renúncia ao pecado e ao demônio e a fé professada. A Quaresma tem os olhos voltados para a Vigília Pascal. A vela acesa no Círio Pascal, para a renovação das promessas feitas, será um dos grandes símbolos da vida em Cristo. O mesmo Cristo, as mesmas celebrações, mas um tempo novo!

Durante a Quaresma, chegue a todos o convite da Igreja a intensificarem o tempo de oração. Comecemos pela participação na Missa Dominical, preparada de preferência em família. Propomos ainda a retomada de um bonito costume da família ir à Igreja, com todos os seus membros, escolhendo um horário que dê certo para todos, marcando presença na Missa paroquial e acolhendo os dons de Deus que são oferecidos em abundância. Depois, a oração pessoal, especialmente com a Bíblia, descobrindo a riqueza da chamada leitura orante da Palavra de Deus, “Lectio Divina”. Um bom roteiro pode ser o “Retiro Popular” divulgado pela Arquidiocese de Belém.

Nosso programa quaresmal contempla a caridade para com o próximo. A Igreja Católica realiza durante este período a “Campanha da Fraternidade”. Trata-se de fazer ‘propaganda’ de uma sociedade mais justa e fraterna. Se pudermos, queremos “fazer a cabeça” dos homens e mulheres de nosso tempo para que caiam as barreiras que isolam as pessoas, cresça o relacionamento fraterno e se espalhe a solidariedade. Cada ano se escolhe um tema e um lema candentes, que ajudem a divulgar novos critérios e práticas de fraternidade. Neste ano de 2013, quando nosso país receberá a Jornada Mundial da Juventude, no Rio de Janeiro, de 23 a 28 de julho, a Campanha é sobre “Fraternidade e Juventude”, com o lema “Eis-me aqui, envia-me” (Is 6,8), com o objetivo de “acolher os jovens no contexto de mudança de época, propiciando caminhos para seu protagonismo no seguimento de Jesus Cristo, na vivência eclesial e na construção de uma sociedade fraterna fundamentada na cultura da vida, da justiça e da paz” (Texto-base da Campanha da Fraternidade 2013, n. 4). Caridade neste ano é acolher a juventude e envolvê-la para que contribua na construção de um mundo melhor.

Enfim, Quaresma pede reeducação dos afetos, superação da concupiscência da carne e dos olhos (Cf. 1 Jo 2,16), formação das novas gerações a partir de valores consistentes, jejum, mortificação e equilíbrio no uso dos bens do mundo. Aqui, abre-se um grande horizonte de reflexão e de novas práticas. Propomos um exercício de reorientação dos instintos, superando a tendência à idolatria do prazer, do poder e da posse. Poderá chegar a tais decisões aquela pessoa que refizer seu caminho de seguimento de Jesus Cristo, escolhendo-o como Senhor de sua vida e reconhecendo-o como único Salvador.

Assim, peçamos a Deus as graças para o tempo especial que se inicia: “Concedei-nos, ó Deus onipotente, que, ao longo desta Quaresma, possamos progredir no conhecimento de Jesus Cristo e corresponder a seu amor por uma vida santa”.


BELéM DO PARá, 14 de Fevereiro de 2013 (Zenit.org)

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